A indústria reinventa-se com novos designs, tecnologias sem toque, desinfeção de bagagens ou esterilização automática.
Uma parte essencial da mobilidade da população é a abundância de ligações aéreas por preços que há apenas algumas décadas seriam impensáveis. Todavia, foi esta mesma facilidade que levou à propagação do novo coronavírus, que rapidamente saiu da China e se espalhou pelo mundo na era mais globalizada da História. As implicações do confinamento e a suspensão de voos entre países e continentes foi, por isso, dramática para a indústria da aviação.
As companhias aéreas, as agências de viagens e todos os negócios associados ao turismo e conferências estão num momento de inflexão por causa da pandemia. Em 2019, tinha-se registado um recorde no número de passageiros aéreos: 4,54 mil milhões de pessoas. É como se mais de metade da população mundial tivesse entrado num avião no ano passado, quando ainda estávamos longe de prever a aterragem forçada que a covid-19 iria trazer em 2020.
A previsão para este ano era ainda mais impressionante: de acordo com os dados da Statista, esperava-se um novo recorde de 4,72 mil milhões de passageiros. Agora, com uma primavera de confinamento e muitas restrições às viagens ainda em vigor, as perspetivas são voláteis. Estima-se que o total de passageiros aéreos ronde os 2,24 mil milhões, o que é um regresso a níveis de 2006. Haverá uma recuperação no próximo ano para 3,38 mil milhões, mas ainda assim estaremos em mínimos de 7 anos.
Lenta recuperação
Dependendo de como a pandemia for controlada e quão cedo se obtenha uma vacina, o futuro não é, contudo, sombrio. "A perspetiva de longo prazo para a aviação e viagens continua a ser favorável", escreveu na Forbes o especialista em aviação Dean Donovan. "A integração global subjacente, o crescimento económico e o aumento dos rendimentos e tempo de lazer dos consumidores, que impulsionaram a procura por estes serviços mais rapidamente do que o crescimento do PIB durante décadas, devem continuar a fazê-lo à medida que o mundo se recupera do choque da covid-19", afirmou.
Donovan prevê que os volumes anteriores só serão recuperados dentro de três a cinco anos e que o preço recupere mais lentamente que o volume. Acredita também que as viagens de negócios vão voltar mais depressa que o turismo, mas não deverão regressar aos níveis anteriores.
Este é um ponto que tem sido discutido transversalmente. Com grande parte das pessoas a trabalhar de forma remota, as empresas perceberam que podem ser eficientes mesmo sem deslocações físicas para reuniões, painéis e conferências. A expectativa é que muitas viagens de negócios habituais sejam reduzidas ou permanentemente canceladas.
Por outro lado, uma nova pesquisa da DCI (Development Counsellors International) mostra que a maioria dos consultores de viagens só esperam uma retoma das atividades de marketing nos seus mercados entre setembro e dezembro, sendo que 21% olham já apenas para 2021 e anos seguintes.
Voar será uma experiência diferente
O consenso entre os analistas da indústria de aviação é que voar será uma experiência diferente no mundo pós-covid, da mesma forma que tudo mudou após o 11 de setembro. Além das mudanças imediatas, que incluem verificação de temperatura, utilização obrigatória de máscaras e uma passagem mais lenta pelo controlo de segurança, haverá modificações estruturais.
Por exemplo, no início de junho as empresas Safran e Universal Movement apresentaram um novo design para os assentos das cabines dos aviões, com um separador curvo no meio para evitar contacto entre as pessoas – e até dar-lhes mais privacidade. Este design, chamado Interspace Lite, vai começar a ser produzido já no início do verão.
Em abril, a italiana Aviointeriors tinha lançado o trio de assentos em que o do meio está virado ao contrário. Há várias ideias que poderão mudar de forma significativa a experiência de voo, colocando um ponto final na tendência de economia que vinha apertando cada vez mais os passageiros em espaços exíguos.
Antes de embarcar, a jornada no aeroporto também será diferente. A CNBC mostrou como Hong Kong instalou "chuveiros" de desinfeção para as pessoas, usando um processo de esterilização que dura 40 segundos. Os especialistas citados pela estação preveem que as bagagens passarão a ser desinfetadas de forma rotineira, por exemplo durante a passagem na máquina de raio-x, usando algo como luz ultravioleta ou outra técnica rápida.
Haverá também uma tendência em larga escala para implementar tecnologias sem toque no máximo de pontos, fazendo uso de reconhecimento facial e reconhecimento da íris. O smartphone do passageiro será uma ferramenta fundamental para a jornada, funcionando como um "controlo remoto" de quiosques de check-in e entrega de bagagem, de forma a evitar a necessidade de tocar em botões ou superfícies táteis.
Tal como aconteceu com o 11 de setembro, a covid-19 mudará radicalmente a experiência de voar, dizem os analistas.
Será também o ponto de contacto, por exemplo, com a companhia aérea: para evitar que se formem filas de pessoas nas portas de embarque, as transportadoras podem chamar os passageiros um a um através de uma app. A Delta Airlines já tinha anunciado novidades deste género em janeiro, com um concierge digital e uma solução de "realidade paralela" que agora podem ser usadas para ajudar a mitigar riscos.
A nova experiência de aeroporto será desenhada para manter as pessoas sempre a andar e não amontoadas em filas, sofás e zonas de embarque. Será uma aceleração sem precedentes de inovações que começaram a chegar há mais de uma década: foi em 2007 que a empresa portuguesa Vision-Box instalou no aeroporto de Lisboa os primeiros quiosques de reconhecimento biométrico, permitindo aos passageiros com passaportes eletrónicos dirigirem-se às máquinas em vez de esperarem na fila pelo controlo de um agente humano.