
Europa do Norte e África em fases opostas da transição energética

A Noruega já começou a retirar subsídios para os carros elétricos, porque já são a norma. Portugal ainda precisa de mais incentivos para o longo caminho a percorrer. E África ameaça intensificar a produção de combustíveis fósseis a contraciclo com a revolução verde dos países mais desenvolvidos.
A transição energética e o avanço da mobilidade sustentável correm a velocidades muito díspares nas diferentes geografias, numa desigualdade que ameaça o objetivo comum de interromper o aquecimento global. Se na Noruega, por exemplo, a mobilidade elétrica é já o novo normal e com cada vez mais energia verde, em África os países produtores querem ainda aumentar a produção de combustíveis fósseis, como deixaram claro numa reunião em Adis Abeba em agosto, fazendo da ideia da descarbonização dos transportes e da economia global uma utopia cada vez mais distante.
Num meio termo entre estes dois exemplos, Portugal continua a sua caminhada em direção à descarbonização, figurando no top 5 dos países europeus onde há maior percentagem de veículos elétricos ou híbridos nas novas vendas de automóveis. Em agosto, estes veículos representaram já 10% do mercado.
Mas a esmagadora maioria da população ainda não consegue aceder aos preços mais elevados dos carros elétricos nem está devidamente consciencializada para a necessidade urgente dessa transição, como apontaram os oradores do último debate do Portugal Mobi Summit que se centrou nas motivações e incentivos para a mobilidade elétrica.
Enquanto na Noruega os apoios para a compra de veículos elétricos já estão a ser retirados, pois estes já representam cerca de 90% das vendas, em Portugal a Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos (UVE) ainda vai propor ao Governo o aumento dos incentivos para a compra de elétricos dos 4 mil para os 6 mil euros a vigorar em 2023 e a sua extensão aos usados para que pessoas com menor poder de compra também possam aceder à mobilidade sustentável e assim contribuir para o esforço da descarbonização.
Já em África esse esforço parece ser ainda uma miragem. Na cimeira do clima das Nações Unidas, prevista para novembro, os líderes africanos vão mesmo anunciar que precisam do acesso às suas reservas de petróleo e gás, podendo até beneficiar de alguma compreensão do resto do mundo face ao défice de gás gerado pelos cortes de abastecimento da Rússia.
Mas ativistas ambientais africanos temem que tais intentos ameacem as metas climáticas globais e impeçam o desenvolvimento de energia renovável em África e, em vez de ser usada para o benefício das pessoas comuns, enriqueça as corporações multinacionais, investidores e as elites de alguns países. Porque é preciso lembrar que neste continente cerca de 580 milhões de pessoas ainda não têm acesso à eletricidade e energia moderna. Mas são os que menos poluem e estão, desde há muito, habituados a andar a pé e a usar a bicicleta, os dois modos de mobilidade mais amigos do ambiente.
Em Lisboa, as bicicletas e as trotinetes vão conquistando terreno e impondo, aos poucos, uma mobilidade mais suave. As 1600 bicicletas partilhadas GIRA, da EMEL, têm dado um importante contributo para essa nova mobilidade. Em entrevista ao Portugal Mobi Summit o presidente daquela empresa muncipal, Carlos Silva, anunciou que vão nascer em breve mais estações de bicicletas na cidade.
Governo e autarquias acreditam, de resto, que é pelo incentivo à compra de veículos não poluentes e pelo aumento da oferta diversificada de meios de transporte público partilhado que se fará a revolução da mobilidade sustentável. Mas primeiro é preciso mudar as mentalidades e hábitos.
Carla Aguiar