Melhorar os transportes e restringir o carro é a chave para cidades mais sustentáveis

2022
08-07-2022

Amentar a oferta e a qualidade do transporte coletivo, tornando-o gratuito, alargar redes pedonais e criar zonas livres de carros são as soluções de Lisboa e Cascais para melhorar o ambiente.

Como tornar o transporte público mais atrativo para quem usa o carro diariamente para se deslocar dentro das cidades? E como se combate o estigma do transporte coletivo e se desconstrói o status do automóvel individual? Encontrar a chave para estas questões é um desafio prioritário para as cidades um pouco por todo o mundo no momento de emergência climática que vivemos. E foi o tema de mais uma sessão do Portugal Mobi Summit, que contou com os exemplos dos municípios de Lisboa e de Cascais.

Ainda que não seja das maiores do mundo, a área metropolitana de Lisboa tem 2,8 milhões de habitantes e 60% usam o carro individual. Inverter esta situação e levar a população a adotar meios de mobilidade coletivos e suaves é, por isso, o grande desafio assumido pelos dois municípios.

Miguel Pinto Luz, vice-presidente da Câmara Municipal de Cascais não tem dúvidas de que, apesar de ser difícil, “há coisas que se podem fazer já” para convencer as pessoas a trocarem o transporte individual por outros modos de mobilidade. “Temos de aumentar a oferta, e fazê-lo ao mesmo tempo que melhoramos a qualidade e a previsibilidade do transporte público”, defendeu o autarca de Cascais no segundo debate do Portugal Mobi Summit. Isso exige investimento, modernização e uma gestão mais eficiente de toda a operação de transporte.

No município cascalense o executivo apostou na gratuidade do transporte rodoviário, o que é pioneiro em Portugal, e na renovação da frota de autocarros, com espaço para bicicletas, wi-fi, ar condicionado e tv corporativa.

Já do lado da procura, Miguel Pinto Luz considera que há medidas que podem ser postas em prática, como por exemplo, impedir a circulação de automóveis antigos em certas zonas da cidade (visto que estes são responsáveis por mais 90% das emissões), criar zonas livres de carros e penalizar o transporte individual face a outras formas de mobilidade.

Por muito dura que possa parecer, esta transformação “vai ter de acontecer já, sob pena de não conseguirmos cumprir as metas 2030/2035”, conclui o autarca.

O vice-presidente de Cscais acredita que “esta evolução vai acontecer tal como sucedeu com a reciclagem do lixo, só que, ao contrário dessa fase em que tinhamos tempo para mudar as mentalidades, agora não temos tempo”. Por isso mesmo, Pinto Luz considera que “hà que fazer escolhas e tomar decisões”.

O papel da Carris Metropolitana

Para a diretora municipal de mobilidade da Câmara Municipal de Lisboa não há receitas fáceis nesta matéria. “Se tivessemos uma resposta pronta tinhamos o problema resolvido”, disse Francisca Ramalhosa. A responsável acredita, no entanto, que em Lisboa foram já dados passos muito significativos com a criação da Carris Metropolitana, para abranger uma zona mais vasta, e com o Cartão Navegante, que melhora o acesso ao transporte público, não só pela baixa de preço, mas também pela simplificação. A este respeito Pinto Luz considerou mesmo decisivo esse passo que torna possível a alguém que more no Barreiro e trabalhe em Cascais ou se desloque do Montijo para Sintra ter transporte a pagar menos 20% do que há quatro anos.

Francisca Ramalhosa ressalva ainda que a dependência do carro individual “é também uma questão muito cultural, que deve ser contrariada e trabalhada”. E exemplifica: “Por mais oferta de transportes públicos que haja, as pessoas estão habituadas a chegar aos 18 anos e ter um carro em vez de um cartão de mobilidade integrada”, disse. Por isso, admite, “esse é um caminho que tem de ser feito em paralelo com a introdução de melhorias na infraestrutura e na tecnologia”.

Combater o estigma do transporte público

Qualquer evolução nesta matéria terá de passar pelo combate ao estigma social do transporte público, concordam os dois autarcas. “O automóvel ainda é um símbolo de aspiração social”, admite Miguel Pinto Luz ao mesmo tempo que assinala o menor número de jovens que atualmente tira a carta de condução aos 18 anos. “Esta tendência já está a acontecer, o problema é que não podemos esperar tanto tempo” até que uma tendência se confirme plenamente. E lembra que, para muitos jovens, “já é mais cool ter um cartão uber e uma bicicleta”. Há pois que explorar este efeito moda, que conta muito para a alteração dos comportamentos dos mais jovens.

Em Lisboa está igualmente planeada a entrada em vigor, ainda este ano, da gratuitidade do transporte, mas apenas aos estudantes e aos idosos, o que também é um medida com impacto social, convidando ao lazer dos mais velhos.

A diretora de mobilidade da capital lembra que “Lisboa tem uma população bastante envelhecida e tem de se encontrar um modo de convivência pacífica entre as várias formas de mobilidade e as diferentes gerações”.

Por outro lado, Franscisca Ramalhosa considera que “é preciso investir no alargamento de uma rede pedonal com segurança, porque são muito poucos os percursos que não podem ser feitos a pé”. E isso passa, muitas vezes, por restringir os carros em certas zonas, o que torna logo os percursos a pé mais seguros e agradáveis.

Certo é que a mobilidade integrada, quer a nível da rede de transportes complementares quer das apps - que permitem usar tanto uma bicicleta, uma trotinete ou uma autocarro no mesmo percurso - é o futuro da mobilidade nas cidades, concordam os dois autarcas. 

 

Carla Aguiar

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