Lisboa pontua bem em mobilidade

"Lisboa pontua bastante bem em matéria de mobilidade", considera Simon Dixon, partner da Deloitte e global transportation leader. Entre os pontos fortes da capital portuguesa está "a visão e estratégia do município, focado em investir na maior eficiência e intermodalidade dos transportes". Do lado das fragilidades está, segundo aquele especialista baseado em Londres, o elevado peso de automóveis próprios em circulação.
"Em Lisboa a percentagem de pessoas que circulam em carro próprio é de 54%, o que consegue mesmo superar algumas cidades nos Estados Unidos, onde existe tradicionalmente uma maior ligação ao automóvel" observa John Skowron, principal da Deloitte, em Pittsburg (Estados Unidos).
Na comparação com outras cidades a nível mundial, Lisboa destaca-se ainda por ter um "baixo custo de parqueamento, registar forte congestionamento de trânsito e alta taxa de acidentes nas estradas de acesso", apontam aqueles especialistas de passagem por Lisboa para uma sessão de partilha de boas práticas internacionais no domínio das cidades inteligentes com entidades municipais e empresariais.
"O objetivo da Câmara de Lisboa é reduzir a circulação em carro próprio para 40% e 30%, em linha com outras cidades de referência", refere, a propósito, Miguel Eiras Antunes, partner da consultora com o pelouro do setor público, transportes e infraestruturas e coordenador das áreas da mobilidade do futuro e das smart cities.
Aquele consultor considera que, apesar dos constrangimentos, a mais-valia de Lisboa é a de "já ter projetos para ultrapassar os estrangulamentos encontrados". Um exemplo disso mesmo é o facto de "os planos nacionais e municipais estarem a ficar mais integrados e de Lisboa já discutir planos de mobilidade em conjunto com outras autarquias como Cascais".
Uma das necessidades identificadas é o reforço e melhoria dos transportes públicos para convencer mais pessoas a deixarem de usar o carro.
Ficar mais inteligente
De que precisa então uma cidade para se tornar inteligente? John Skowron - que responde a esta questão um pouco por todo o mundo - não tem dúvidas em afirmar que "o primeiro passo é ter um objetivo e uma visão clara para a cidade" e o segundo é "comprometer-se em melhorar a qualidade de vida". Trata-se de "servir melhor os cidadãos e permitir-lhes fazer escolhas alinhadas com o seu estilo de vida", nomeadamente em matéria de mobilidade, porque "se as pessoas e empresas não se conseguirem mover bem, então não é uma cidade boa para viver".
Desenvolver a competitividade económica, no sentido de atrair talentos e investimentos, é apontado como outra condição de inteligência e, por fim, defende-se a aposta na sustentabilidade.
"Uma vez atingidos esses objetivos cria-se o ecossistema para atrair parceiros de negócio, que promovem a inovação, trazendo a especialização do setor privado para o setor público, resume Simon Dixon. E, prossegue, "a partir daí entramos numa fase em que pomos os sistemas a falar uns com os outros e a tomar decisões com base nos dados partilhados por várias entidades".
A consultora está a trabalhar na construção de um index de 55 cidades dos cinco continentes sobre como pontuam em mobilidade e no conceito de smart city, que deverá estar pronto em abril.
Os peritos da Deloitte apontam ainda a necessidade de envolver os cidadãos. "Se queremos que as pessoas mudem os seus comportamentos temos de as envolver e de lhes dar vantagens por usarem carros partilhados, elétricos ou transportes públicos", assevera Simon Dixon. "As experiências têm demonstrado que as pessoas precisam de se sentir próximas e que respondem muito melhor quando têm uma influência direta nos resultados", conclui. Um exemplo apontado, que tanto funciona em Buenos Aires como em Cascais, é a possibilidade de, através de uma fotografia tirada e enviada pelo telemóvel, um cidadão poder denunciar à sua autarquia um problema com a sua rua, seja um buraco ou uma conduta rebentada, e de poder monitorizar o tempo que demora a ser resolvido. "Em Buenos Aires, por exemplo, as taxas de satisfação da população subiram bastante".
Outro sinal de inteligência urbana, que parte de Cascais, é, por exemplo, o facto de os camiões de recolha de lixo terem um botão em que os funcionários podem carregar para notificar situações de buracos nas vias ou outras avarias, fornecendo a localização exata por via da geolocalização.
Não é por acaso que a vila de Cascais foi apontada como exemplo de mobilidade em janeiro último, em Las Vegas, numa das maiores feiras de tecnologia, devido ao seu sistema de mobilidade MobiCascais.
A partilha de informação é considerada central para o desenvolvimento de cidades inteligentes. Um exemplo nesse sentido é aplicado nos transportes de Londres, que, ao abrir as suas redes, permitiu o desenvolvimento de aplicações várias sobre a frequência e horários dos autocarros, aumentando a adesão e satisfação dos utentes.
Os peritos da Deloitte admitem que a maior mobilização em torno da mobilidade e das smart cities se notou nos últimos três anos, representando duas das quatro áreas estratégicas para a consultora. "Têm uma importância muito significativa, porque estas matérias envolvem áreas como energia, transportes, legislação, seguros e também impostos, tudo setores em que estamos envolvidos".
E há outros impactos que a consultora está a antecipar: "À medida que a mobilidade se torna mais elétrica, autónoma e partilhada, isso quererá dizer que governos e municípios terão menos receitas por via dos impostos sobre produtos petrolíferos e sobre veículos, pois haverá uma tendência para se comprarem menos carros".
"O contributo da Deloitte nesta área é agilizar um ecossistema de mobilidade, juntando os maiores players e facilitar a implementação de medidas", resume Miguel Eiras Antunes.
Carla Aguiar