“Cada vez há mais carros em Lisboa, não aprendemos nada com a COVID”

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23-10-2025

Partilhar as ruas com carros, bicicletas e peões exige medidas de acalmia de tráfego mais robustas do que as que existem atualmente. O desenho das ciclovias de Lisboa no mandato de Fernando Medina mereceu duras críticas de especialistas em mobilidade na perspetiva da segurança, no segundo dia do Portugal Mobi Summit, que decorre no auditório do IPMA, em Algés.

Como partilhar as ruas com carros, bicicletas e peões em segurança? É a questão do milhão de dólares e foi à sua volta que correu o primeiro painel de debate do segundo dia do Portugal Mobi Summit, em Algés. Tentando responder à pergunta, Rui Soares Ribeiro, ex-presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, disse que em primeiro lugar é preciso reduzir os carros nos centros das cidades. Mas, ao invés disso, “cada vez há mais carros em Lisboa, não aprendemos nada com a COVID. Numa cidade com cerca de 600 mil habitantes, entram cerca de 500 mil carros por dia, exemplificou.

E o futuro não parece estar a travar a fundo essa tendência, tendo em conta que está planeada uma terceira travessia do Tejo e um túnel entre as margens que vai trazer mais pessoas para Lisboa.

Por isso, a aposta tem de ser no transporte público. E, sobretudo, em "redesenhar a cidade que foi desenhada para carros para integrar mais as necessidades das pessoas".

 

"Para isso é preciso coragem dos autarcas e dos decisores políticos", admitiu Pedro Soares Ribeiro. E deu exemplos de cidades como Gent, na Bélgica, ou Bolonha, em Itália, com sérias restrições aos carros no centro da cidade.

 

Já para o presidente do Automóvel Clube de Portugal (ACP), Carlos Barbosa, a questão da conflitualidade entre os diferentes meios de transporte está sobretudo na falta de alternativas. "Em Berlim, por exemplo, há vários silos automóveis à entrada das cidades e não há conflitos".

Os principais inimigos da micromobilidade são os autarcas”, disse Carlos Barbosa. E deu como mau exemplo o desenho das ciclovias do tempo do ex-presidente de Lisboa, Fernando Medina. “O que foi feito nas ciclovias da Almirante Reis e na Rua Castilho, por exemplo, foi uma loucura”, com riscos para a segurança dos ciclistas e imensos pontos de conflito com os automobilistas, considerou aquele que foi também deputado muncipal durante dez anos.

Por isso, “considero que o carro não é o problema. Têm é de ser encontradas soluções de parques, mas que não sejam em locais desencorajadores”.

Sobre o mesmo tema, Pedro Coutinho, co-fundador da Lane Patrol, que presta consultoria a municípios nacionais e estrangeiros sobre como implementar ciclovias, conclui que, muitas vezes, “as decisões dos autarcas são tomadas sob pressão, sem o devido estudo, baseado em dados, e sem uma visão”. Pedro Coutinho admite que há situações em que não espaço para ter vias segregadas e os diferentes modos têm de conviver na mesma via. Mas isso é sempre um desafio. Tal como aquele em que estão a trabalhar em Barcelona, onde foram contratados para sugerir a reformulação de uma avenida, na Diagonal Mar, com "uma ciclovia de alta velocidade a meio, onde se cruzam espaços verdes e crianças, que ninguém quer usar, porque não é seguro para ninguém, nem para os ciclistas nem para as pessoas".

O consultor também deu como maus exemplos as ciclovias da Rua Castilho e da Almirante Reis, que o último executivo camarário quer redesenhar.

Adam Tranter, ex-comissário para a mobilidade ciclável e pedonal, West Midlands, Reino Unido e CEO da Fusion Media, partilhou da visão dos seus colegas de painel e considerou que “Lisboa não parece ter um plano ou uma visão para a micromobilidade”. E, acrescentou, parece haver uma série de entidades, como a CP e o Metro, que não cooperam e parecem estar umas contra as outras no planeamento da mobilidade urbana.

Sobre o sempre polémico tema do limite de velocidade nas cidades, Carlos Barbosa revelou que encomendou um estuto ao Instituto Superior Técnico (IST) para conhecer as velocidades praticadas em Lisboa, quer pelos carros, quer pelos autocarros da Carris e tentar saber como é que se pode melhorar a adequação da sinalização e dos radares. Porque, disse, “Há localizações com limites a 80 Km/h que deveriam ser a 50 km/h e vice-versa”. O ACP aguarda as conclusões desse estudo dentro de três meses.

O que é certo, e todos concordaram, é que "há excesso de velocidade nas cidades e muitos atropelamentos". Os autarcas podem intervir preventivamente com a introdução de medidas de acalmia de tráfego, como lombas, tapetes coloridos, ou afunilamento de vias para obrigar a abrandar a velocidade, defendeu Pedro Soares Ribeiro.

carla aguiar

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